quarta-feira, 25 de julho de 2018

Eutanásia na Bélgica: balanço da Commission de contrôle para 2016-2017

No passado dia 17 de Julho, a Commission fédérale responsável por controlar as eutanásias na Bélgica entregou o seu relatório bianual ao Parlamento, revelando um novo forte aumento dos casos declarados pelos médicos.
Segundo a Commission fédérale de contrôle et d’évaluation de l’euthanasie (CFCEE) foram registadas 2.028 eutanásias em 2016, e em 2017 o numero aumentou para  2.309 , o que representa uma subida de quase 14 % neste último ano conhecido. Desde que a Lei foi votada em 2002, o número de eutanásias tem aumentado sistematicamente em cada ano, tal como testemunha o gráfico publicado no relatório oficial:

Estão abrangidos o mesmo número de homens e de mulheres, geralmente muito idosos, mas, em que cerca de 1/3, têm menos de 70 anos. 78% dos atos são executados na Flandres, contra 22% na Valónia, estando esta grande disparidade geográfica, na verdade, ligada a razões culturais.
45% das eutanásias são praticadas no domicílio, 39% no hospital e as restantes em instituições de saúde ou lares. Os cancros estão na origem de 64% dos pedidos, os restantes casos estão ligados a «uma combinação de várias doenças (poli patologias)», segundo os dados do relatório, e, em 15% destes diferentes casos, a pessoa não se encontra em fim de vida. Os pedidos de eutanásia com base em distúrbios mentais ou de comportamento, cujo discernimento e a autonomia são frequentemente objeto de debate, representam uma quarentena de casos por ano.
 Três eutanásias de menores foram registadas em 2016-2017, duas na Flandres e uma na Valónia. As crianças tinham 9, 11 e 17 anos. Estes três pacientes «tinham todos doenças incuráveis e particularmente graves que iam conduzir à sua morte a curto prazo», refere a CFCEE no seu relatório. São os primeiros três casos desde a Lei de fevereiro de 2014, sendo a Bélgica o único país do mundo a autorizar as eutanásias de menores sem nenhum limite de idade.
A subida contínua dos casos de eutanásia na Bélgica inquieta alguns deputados e médicos, mas, satisfaz os defensores desta prática: para Jacqueline Herremans, presidente da Association pour le droit à mourir dans la dignité (ADMD belga) e membro da CFCEE, «a eutanásia entrou claramente nos costumes. De entre as razões que explicam este aumento, temos o evidente efeito geracional: a lei, votada em 2002, é agora mais conhecida pelas gerações mais implicadas. Atualmente, a informação é mais difundida.»
Nenhum desvio é assinalado oficialmente. O documento de apresentação deste relatório termina com estas palavras: «A Commission entendeu que todas as declarações recebidas obedeciam às condições essenciais da Lei, não tendo nenhuma declaração sido enviada para o procurador do Rei. A Commission entende que durante estes dois anos que passaram, a aplicação da lei não ofereceu grandes dificuldades nem desvios que necessitariam de iniciativas legislativas.»
Na realidade, nestes últimos meses, surgiram controvérsias importantes acerca da legitimidade de algumas eutanásias, tendo um membro da Commission fédérale de contrôle se demitido para expressar o seu desacordo sobre um caso muito litigioso.
Leia o artigo no original aqui.

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Resumo da Lei de Direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida


No dia 18 de Julho de 2018 foi publicada em Diário da República a Lein 31/2018.
Sem prejuízo da aplicação do regime jurídico sobre diretivas antecipadas de vontade em matéria de cuidados de saúde, testamento vital e nomeação de Procurador de cuidados de saúde (artigo 12º- disposições finais), esta Lei nº 31/2018, estabelece um conjunto de direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida, consagrando o direito a não sofrerem de forma mantida, disruptiva e desproporcionada (artigo 1º nº 1). Também prevê no nº 2 do seu artigo 1º um conjunto de direitos dos familiares das pessoas doentes referidas no número anterior.
O âmbito de aplicação desta Lei está definido no artigo 2º considerando se pessoa em contexto de doença avançada e em fim de vida “quando padeça de doença grave, que ameace a vida, em fase avançada, incurável e irreversível e exista prognóstico vital de 6 a 12 meses”.
Os direitos destas pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida são depois consagrados no artigo 3º e compreendem o direito a receber informação detalhado sobre o seu estado de saúde e tratamentos, o direito a participarem ativamente no seu plano terapêutico, o direito a receber tratamento rigoroso dos seus sintomas.
Reforça a proibição de realizar distanásia através de obstinação terapêutica e diagnóstica (artigo 4º).
O consentimento informado deve ser prestado por escrito no caso de intervenções de natureza mais invasiva ou que envolvam maior risco para o bem-estar dos doentes (artigo 5º nº2). O número 3 do artigo 5º reitera o direito destes doentes de “recusar o suporte artificial das funções vitais e a recusar a prestação de tratamentos não proporcionais nem adequados ao seu estado clínico e tratamentos, de qualquer natureza, que não visem exclusivamente a diminuição do sofrimento e a manutenção do conforto do doente, ou que prolonguem ou agravem esse sofrimento”.
Outro direito referido nesta lei é o direito a cuidados paliativos através do Serviço Nacional de Saúde previsto no artigo 6º nº 1, com o âmbito e forma previstos na Lei de Bases dos Cuidados Paliativos. O seu número 2 vai um pouco mais longe ao incluir na prestação de cuidados paliativos, o apoio espiritual e o apoio religioso, caso o doente manifeste essa vontade e o apoio estruturado à família que se pode prolongar à fase de luto. A prestação dos cuidados paliativos podendo ser prestada “por equipa multidisciplinar de profissionais devidamente credenciado e em ambiente hospitalar, domiciliário ou em instituições residenciais nos termos da lei” (artigo 6º nº 3).
O artigo 7º legisla acerca dos cuidados paliativos em ambiente domiciliário referindo vários direitos do cuidador informal da pessoa em contexto de doença avançada e em fim de vida que recebe cuidados paliativos ambiente domiciliário. Estes cuidadores informais têm direito a receber formação adequada e apoio estruturado (artigo 7º nº1), direito a descanso requerido pelos profissionais de saúde sempre que tal se justifique (artigo 7º nº 2). Para tal, esse cuidador informal tem de estar devidamente sinalizada na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e ou na Rede Nacional de Cuidados Paliativos (artigo 7º nº3).
O artigo 8º regula as situações de prognóstico vital breve que não tenham sido controladas pelas medidas de primeira linha previstas no nº 1 do artigo 6º.
Os direitos não clínicos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida estão previstos no artigo 9º.
Finalmente nos artigos 10º e 11º referem-se à tomada das decisões clínicas e formas de dirimir discrepâncias de vontades ou decisões, respetivamente.
Ana Velosa, jurista