A eutanásia tão mediatizada de Anne Bert não pode deixar ninguém indiferente. Todos os doentes com graves patologias degenerativas e incapacitantes merecem ser escutados, apoiados e acompanhados. E o dramático desfecho da doença de Anne Bert, que nos entristece, não pode ser um porta-voz de outros doentes, das suas famílias e de todos os profissionais e voluntários que cuidam deles.
Nós assistimos a uma teatralização de uma situação pessoal dolorosa que foi feita até ao anúncio de um livro que deveria ser publicado depois de um suicídio assistido programado na Bélgica, todo um cenário para o qual os Franceses foram involuntariamente conduzidos, sem filtro. Não se trata aqui de julgar uma pessoa mas, nós, temos o dever de refletir para compreender o alcance da sua derradeira decisão que, tendo sido tão amplamente anunciada, nos faz duvidar sobre a existência de uma verdadeira liberdade no momento da sua morte. Será que ela poderia ter desistido e se retratado sem dececionar aqueles que criaram uma personalidade emblemática para a sua reivindicação, sem esquecer também o seu editor?
Mas, é sobretudo sobre o impacto deste suicídio nos doentes, suas famílias e seus cuidadores, que nós nos devemos concentrar. Permitir que se oiça dizer que existe uma «coragem de morrer», numa circunstância idêntica, significa ocultar a coragem de viver. É muito grave deixar que as pessoas fragilizadas pensem que é preferível morrerem a viverem, que é melhor a eutanásia que os cuidados e a investigação. Qualquer pessoa precisa de ser acompanhada e apoiada nessas situações de grande dependência. A mediatização de uma situação que recusa a dependência oculta os testemunhos exemplares daquelas pessoas que o assumem e revela a exclusão da vulnerabilidade que caracteriza a nossa cultura.
Fala-se do necessário exílio na Bélgica, mas, o que é chocante é a desigualdade, não perante a morte, mas perante a vida: no que diz respeito ao acompanhamento das pessoas, ao acesso aos cuidados paliativos. Iremos nós fazer tudo para lutar contra a dor, contra os sofrimentos morais, sociais e espirituais que existem no fim de vida? Iremos nós empregar os meios necessários ou caminhamos para uma solução de facilitismo que é a de "apagar" as pessoas?
A fronteira que não podemos ultrapassar para conseguirmos viver em sociedade, é a interdição de matar. O ponto de partida é recusar tanto a obstinação terapêutica como a eutanásia. Esta é a escolha humana que fez a França. O risco seria de dificultar o imenso trabalho da investigação médica na luta contra as doenças, em especial, aquela que afetava esta mulher e na luta contra a dor.
As pessoas mais vulneráveis ensinam-nos muito sobre a humanidade. Não é aceitável que essas pessoas sejam julgadas consoante a sua suposta utilidade. O olhar que nós colocamos sobre elas determina frequentemente o olhar que eles colocam sobre si próprias.
Uma sociedade que considerasse que, a eutanásia é uma obrigação para uma pessoa gravemente doente, perderia a sua humanidade.
Esta é a razão pela qual esta mediatização nos deve conduzir a um exame de consciência, sem nos deixarmos enganar por aqueles que querem lucrar ao forçar o governo a curvar-se para uma sociedade da eutanásia e do suicídio assistido.
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