quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Opinião de Antonio Noguera, medico especialista em cuidados paliativos

Por que diz um paciente : "Eu não posso mais"?
Há dias em que acorda, não sabe bem porquê, mas acorda especialmente sensível, como se quisesse encontrar algo que precisa e que o vai completar. Talvez precise de encontrar um motivo para redescobrir o significado, dar algo de volta a alguém que precisa especialmente de ajuda.
Um novo dia de trabalho é especial ou de rotina? Serve para deixá-lo absorver quem está ao seu redor? Significa estar rodeado por colegas, com quem discutir o que fazer para melhorar os pacientes que vamos tratar ao longo do dia.
Os meus pacientes são especialmente frágeis, a maioria deles sofre de cancro avançado, onde os tratamentos só podem retardar o desenvolvimento da doença. Ou então porque não se lhes pode oferecer tratamentos mais específicos. Quando esse tempo vem a nossa obrigação, mais do que nunca, é ajudá-los a superar as dificuldades da doença que sofrem. Em muitos casos, recorrer a tratamentos mais poderosos que faria mais mal do que bem.
Mas será que isso basta?
O que acontece? A progressão da doença enfraquece-os, vão colocar limites sobre o que podem fazer. Todos os meses, a cada semana, até mesmo de um dia para o outro os pacientes devem assumir que, em vez de serem capazes de dar vinte passos, só podem dar dez. Levantar do sofá pode parecer escalar uma montanha. Tudo isso, acontece muitas vezes depois de muito tempo a  lutar para superar uma doença.
Como estão? Abatidos, desanimados, observando a vida que lhes escapa, exaustos de serem como são, mesmo esperando que isso acabe o mais rápido possível. Não é compreensível que estejam assim? Então ... Por que continuar?
É aí que a nossa experiência como médicos, pode ajudá-los a fazerem muitas coisas e, na sua fragilidade, o paciente é que tem de dizer-nos como está.
Já tive pacientes desmoralizados que não querem morrer, mas apenas não querem viver desta maneira. Como médico o meu papel é ver que dentro dos seus limites há muitas coisas que podem continuar a fazer: ainda podem desfrutar de milhares de detalhes do quotidiano. Se os levar a ver que valem muito, se através de um olhar simpático, posso ajudá-los a ver sua dignidade, é aí que realmente estou a realizar o meu trabalho. E para tudo isso, eu não sou ninguém especial. Tudo o que faço é ajudar a iniciar uma estrada, e ter o apoio de uma equipa de médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, capelão ...
Por que desmoraliza o paciente? Eu acho que não é só pelo seu sofrimento, mas pelas milhares de mensagens contraditórias que enviamos sobre o que uma pessoa útil. É normal para um paciente que sofre de uma doença que não pode ser curada, que queira que tudo termine, porque vive numa sociedade, que o faz crer que é um inútil.
Posso assegurar-lhes que quando os ajudamos a "recuperarem" a sua dignidade, vêem-na reflectida na forma como nos importamos com eles, tornam-se exemplos vivos de como superar as dificuldades.
Estes pacientes devolvem todos os nossos esforços com sabedoria e ensinam-nos a estarmos atentos.
Cada paciente é uma lição de como aceitar o fim da vida pela criação de uma relação especial entre a família, a equipa médica e de todas as pessoas ao seu redor. 
Autor: Antonio Noguera,  Atlantes Research Program
Leia a noticia no original aqui.

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